Praça do Bocage

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História da Praça do Bocage, publicada na “Monografia de São Julião”.

A ocupação deste espaço, hoje denominado Praça de Bocage, foi alvo das atenções dos povos que por esta região passaram, tendo em consideração a sua excecional localização junto ao rio Sado. Os romanos instalaram aqui, no século I da nossa Era, uma fábrica de salga de peixe que esteve ativa durante cerca de dois séculos, conforme provaram as escavações realizadas nos anos de 1957 e de 1980, sob a orientação do Museu de Arqueologia e Etnografia do Distrito de Setúbal. Após a queda do Império Romano do Ocidente, a fábrica acabou por ser abandonada e invadida pelas areias do Sado, além de ser também utilizada como lixeira.

Só alguns séculos depois, no período da reconquista Cristã, a ocupação deste espaço deixou marcas para os vindouros. Com a conquista dos castelos de Palmela e Alcácer do Sal, que ficavam sob jurisdição da Ordem de Santiago, processou-se o repovoamento das terras junto ao rio Sado, que, dada a sua situação privilegiada, se desenvolveram rapidamente. Então, com a construção da Igreja de São Julião, o seu adro, junto às ruínas da antiga fábrica romana, definiu o esboço do futuro Largo do sapal. Antigo porto para embarcações de pesca, como alguém referiu? Se tal acontecera, as muralhas trecentistas puseram-lhe fim, obviamente. No século XV, por junção de várias casas encostadas a esse lanço sul da muralha, veio a formar-se o Paço do Duque, que ocupava uma área desde o Palácio do Governo Civil, até quase à Igreja de São Julião, fechando a passagem para os terrenos junto ao rio.

O aludido lanço de muralhas ter-se-ia mantido de pé até ao ano de 1835. Dentro da muralha estava localizado o picadeiro do Paço. Por uma Portaria de 31 de dezembro de 1835, o terreno do picadeiro do Paço foi cedido à edilidade para a realização de obras destinadas a melhorar a Praça do Sapal. Foi então que se demoliu o pano de muralha que separava a praça dos terrenos frente ao rio Sado.

O perímetro da parte norte da praça começou a definir-se ainda no século XV, com a instalação da fonte, abastecida pelo aqueduto mandado construir por D. João II, em 1487. A fonte situar-se-ia no centro da praça, mas, em 1533, ao serem construídos os Paços do Concelho, D. João III mandou que a fonte se deslocasse para a frente dos mesmos. Foi então que se iniciaram as obras de alargamento da praça, subordinadas a traçado próprio. Foram demolidas várias casas na parte norte e na parte ocidental para dar mais espaço ao largo, revestido agora de uma importância muito especial.

Na praça viviam personalidades ilustres, tais com o o vedor da fazenda Nuno Fernandes e o físico do Mestre da Ordem de Santiago.Até ao século XIX, o centro da praça teria sido um terreiro, realizando-se enterramento no adro da igreja, ao longo dos séculos XVII e XVIII, como provaram escavações ali realizadas. (…)

A Praça do Sapal foi o local escolhido, após várias tentativas frustradas, para a colocação do monumento a Bocage, construído por iniciativa de António Feliciano Castilho, com fundos angariados por subscrição pública no Brasil e em Setúbal através da imprensa local. A partir de então deixou de se chamar do sapal para tomar o nome do ilustre poeta setubalense.A Praça do Bocage nunca foi ajardinada, mas era ornada por acácias e jacarandás, que lhe conferiam um colorido inebriante na época primaveril. Ao centro ergue-se o monumento a Bocage, inaugurado no dia 21 de dezembro de 1871, sendo a sua construção custeada, como já referimos, por subscrição realizada no Brasil e em Portugal. Sobre uma coluna coríntia, assente sobre quatro degraus oitavados, eleva-se a estátua do poeta, feita de mármore branco. Bocage, com a cabeça descoberta e levemente inclinada, vestido à sua época, empunha na mão direita uma pena de ave e segura na esquerda algumas folhas de papel. A estátua, que tem dois metros de altura, foi cinzelada em Lisboa, na oficina de Germano José de Salles, bem como a coluna. No pedestal do monumento encontra-se a seguinte inscrição: «A M. M. Barbosa du Bocage/Admiradores seus/Portugueses e Brasileiros/MDCCCLXI.» Sob esta inscrição, e nas restantes faces do pedestal, há diversas quadras alusivas a Bocage, em versos históricos. No chão podiam ver-se maravilhosos desenhos e, posteriormente, alguns versos do vate, trabalhados como se de renda se tratasse, na bela e muito apreciada calçada portuguesa. Os bancos e os candeeiros completavam o ambiente agradabilíssimo para os passeios ao fim da tarde, ou ao fim de semana, que culminavam ao som da música, no coreto da avenida. Ladeando a praça encontravam-se ( e alguns deles ainda se encontram) edifícios de porte majestoso: a leste, os Paços do Concelho, monumental construção moderna, de Raul Lino, que procurou manter o estilo do edifício incendiado em 1910; algumas casas de tipo flamengo ou holandês, o grande edifício onde se encontrava o restaurante do Clube Naval e a redação do jornal O Setubalense; a norte, em casas típicas do século XVIII, encontravam-se alguns sindicatos, como mo dos motoristas, o grande prédio onde estava instalada Empresa Transportadora Setubalense e, ainda, o curioso edifício do Corpo da Guarda, construído no século XVII, onde está (esteve) instalado o Distrito de Recrutamento e Mobilização; a oeste, vêem-se diversos edifícios modernos, os mais importantes dos quais são o do morgado da Bandeira (visconde de Montalvo), com o respetivo brasão, o do Paço do Duque e o dos Salemas ou Ximenes, também brasonado, onde tem (teve) a sua sede o Vitória Futebol Clube. Em toda a praça se encontram estabelecimentos de comércio rico e variado. Ao norte da praça, quase em frente da clareira da Avenida Luisa Todi, avultava um prédio de boa arquitetura, pertencente à família Soares. Contígua a ele, podia ver-se a Ermida de Nossa Senhora da Conceição e, junto a esta, a Casa do Corpo da Guarda, com o seu terraço de pedra.

Fotos antigas de Americo Ribeiro.

Foto Américo Ribeiro – 1974
Foto Américo Ribeiro – 1974
Foto Américo Ribeiro – 1951
Foto Américo Ribeiro – 1951
Foto Américo Ribeiro – 1951
Foto Américo Ribeiro – 1951
Foto Américo Ribeiro (1937) – A Praça, ainda com o chafariz que seria depois transferido para o Largo dos Bombeiros
Foto Américo Ribeiro (1937) – A Praça, ainda com o chafariz que seria depois transferido para o Largo dos Bombeiros
Foto Américo Ribeiro – 1930
Foto Américo Ribeiro – 1930
A Praça em 1909 – Arquivo Municipal Américo Ribeiro
A Praça em 1909 – Arquivo Municipal Américo Ribeiro

Obrigado por ler.

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