Introdução
O mundo dos criptoativos, especialmente os NFTs (Non-Fungible Tokens), tem experimentado um crescimento exponencial nos últimos anos, tornando-se um ponto de destaque na economia digital global. No Brasil, esse cenário não é diferente, e a Receita Federal publicou, recentemente, duas novas orientações em Soluções de Consulta sobre a taxação e declarações ao fisco sobre NFTs e utility tokens.
Regulamentação e Principais Instrumentos Legais:
No Brasil, a principal legislação que orienta a tributação de criptoativos é a Instrução Normativa 1.888/2019. Essa normativa, emitida pela Receita Federal, estabelece a obrigatoriedade de prestação de informações sobre operações realizadas com criptoativos, incluindo NFTs. A instrução define criptoativos como a representação digital de valor transacionada eletronicamente, usando criptografia e tecnologias de registros distribuídos.
A obrigatoriedade de declaração se aplica quando o total alienado no mês for superior a R$ 35.000,00. Essa regra engloba todos os criptoativos, como Bitcoin, altcoins, stablecoins e, de forma específica, os NFTs. O NFT deve ser informado na declaração de pessoas físicas com o código 10, com detalhes sobre tipo, quantidade e local de custódia.
Declaração de Transações e Emissões de NFTs:
Em análise à Solução de Consulta nº218/2023, a Receita Federal se manifestou sobre a responsabilidade fiscal de pessoas jurídicas que fazem a emissão ou disponibilizam plataforma digital que permite a realização de transações com utility tokens de forma direta entre seus usuários(peer to peer).
Uma das formas mais comuns de criação dos tokens de utilidade é através da criação de NFTs que atrelam o uso do ativo digital a algum benefício ou tipo de recompensa, como por exemplo o acesso a eventos, produtos exclusivos ou serviços. Nesse caso, mais do que um ativo digital ou um bem único, a NFT é atrelada a alguma utilidade
Segundo a Receita Federal:
“Utility tokens são “tokens de utilidade”, utilizados para acesso a serviços específicos, como jogos online, por exemplo, caracterizando-se como uma espécie de criptoativos, conforme dispõe a resposta à questão nº 457 do “Perguntas e Respostas IRPF 2023”, disponível no site da RFB”
As NFTs são consideradas criptoativos nos termos do art. 5º, incisos I e II da IN 1.888/2019, por serem classificados como a representação digital de valor transacionado eletronicamente e pode ser utilizado como forma de investimento ou instrumento de transferência de valores ou acesso a serviços.
Obrigações da plataforma de transações e dos emissores:
Para fins de tributação, segundo a referida Solução de Consulta, o conceito de exchange inclui a pessoa jurídica, mesmo que não financeira, que atue como intermediadora das transações com criptoativos. Nesse sentido, administradoras de plataformas digitais que permite a troca desse ativos são obrigadas a prestar informações das transações, inclusive de seus usuários, nos termos da cláusula 06ª, I, da Instrução Normativa.
Art. 6º Fica obrigada à prestação das informações a que se refere o art. 1ºI - a exchange de criptoativos domiciliada para fins tributários no Brasil;
Art. 7º Deverão ser informados para cada operação:a) data da operação; b) tipo da operação; c) os titulares da operação;d) os criptoativos usados na operação; e) a quantidade de criptoativos negociados;f) o valor da operação; g) o valor das taxas de serviços
Nesse caso, devem ser informadas todos os tipos de transações, bem como dados dos usuários (KYC), além de dados sobre as operações. Nesse caso, a prestação deve ser realizada até último dia do mês subsequente e na declaração anual, sob pena do pagamento de multa de até R$1.500,00 (mil e quinhentos reais) para a não declaração e de até 3% sobre o valor da operação em caso de inadequação.
No caso de quem emite as NFTs, essas não são consideradas exchanges já que não administram, necessariamente, o ambiente de transações, porém, se obrigam nos mesmos termos e responsabilidades.
No ambiente de Perguntas & Respostas do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) de 2023 esclarece que, mesmo não sendo considerados moeda de curso legal, os NFTs são equiparados a ativos sujeitos a ganho de capital. A Receita Federal determina que os ganhos obtidos com a alienação de NFTs são tributados como ganho de capital, com alíquotas progressivas estabelecidas em função do lucro.
Caminho alternativo
Em análise anterior, na Solução de Consulta nº217/2023 a Receita Federal adotou uma interpretação que pode ser útil do ponto de vista do operador, emissor e usuário de NFTs.
Isso porque, ao analisar um caso de uma plataforma que fazia a intermediação entre imóveis através da disponibilização de ativo digital, no caso uma unidade de um token não fungível representativo do imóvel, a Receita Federal entendeu que a natureza do ativo impede seu enquadramento enquanto criptoativo e consequentemente afasta a obrigação de declarar.
“o ativo virtual a que ela se refere, representativo de um imóvel físico determinado, tem um caráter unitário e infungível. Trata-se de um non fungible token (NFT) representativo de um imóvel único. A consulente, pelas informações por ela prestadas, intermedeia as operações de compra e venda desse NFT e confirma, nas operações de locação do imóvel que o NFT representa, aquilo que chamou de “propriedade digital” (
Nesse sentido, é possível concluir que tratando-se de um ativo meramente representativo de uma propriedade digital, sem vinculação expressa a determinado de tipo de valor, serviço ou produto, não haveria a obrigação de declaração nos termos da Instrução Normativa nº1.888/2019 da Receita Federal.
Conclusão
O desafio da tributação de criptoativos no Brasil, especialmente no contexto dos NFTs, é um reflexo da rápida evolução do cenário digital. A Receita Federal, como órgão regulador, enfrenta a tarefa complexa de adaptar-se a essas mudanças e desenvolver abordagens tributárias que se alinhem com a natureza única desses ativos.
No entanto, a expansão do conceito dos enquandramentos preocupam especialistas que veem na medida uma forma de a Receita Federal adotar assumir o papel típico do legislador, além de criar barreiros para o desenvolvimento de soluções e inovações na área.
O uso de NFTs pode permitir diversas soluções econômicas, que, no entanto, podem se ver comprometidas ante a burocracia e eventual risco de taxação e pagamento de multas por usuários e empreendedores. No caso específico das NFTs de utilidade, uma das recomendações é de que a tributação se limite ao objeto do token. Por exemplo, no caso de uma NFT que da acesso a um evento, que sejam aplicados os tributos convencionais à venda de ingressos, não gerando uma bitributação ou inadequação fiscal.A busca por segurança jurídica e clareza nas regulamentações continua a ser uma prioridade, e a discussão sobre a tributação de NFTs no Brasil está longe de ser concluída.
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Fontes consultadas:
Valor Econômico* - Receita equipara venda de utility tokens a atividade de exchange, mas exclui NFTs de imóveisMachado Meyer - Como Tributar os NFTsDeclarando Bitcoin - Receita Federal esclarece solução de consulta sobre criptomoedas e NFTs na IN 1888*